Relatório de transparência salarial, desafios, riscos e LGPD

20/02/24

A Lei da Igualdade Salarial (Lei 14.611, de 04 de julho de 2023, regulamentada pelo Decreto 11.795 e pela Portaria MTE 3.714, de 23 e 27 de novembro de 2023, respectivamente) surge como um marco importante na busca pela eliminação das disparidades salariais de gênero. Com o intuito de traçar um plano para extinguir tais diferenças, a legislação impõe às empresas com mais de 100 (cem) empregados a obrigação de preenchimento de relatórios de transparência salarial, detalhando informações sobre salários, remunerações e gratificações, que deverão ser publicados no site da empresa ou outro canal de acesso aos trabalhadores e ao público em geral, com a primeira publicação prevista para o mês de março próximo.

A exigência de divulgação de informações detalhadas levanta preocupações sobre possíveis violações à LGPD. As empresas temem que o cumprimento da Lei da Igualdade Salarial possa resultar em riscos significativos relacionados à privacidade dos dados dos seus empregados.

Muito embora a nova legislação estabeleça que as informações constantes do relatório devam ser anonimizadas em cumprimento à LGPD, na prática, as empresas poderão se deparar com um grande desafio. Isso porque não basta a omissão dos nomes dos empregados para que os seus dados sejam considerados anonimizados, uma vez que, sendo possível a reidentificação dos titulares por outros meios, a anonimização deixa de existir.

Se, por um lado, a não publicação do relatório de transparência salarial poderá sujeitar as empresas a multas administrativas substanciais, por outro lado, a exposição excessiva poderá resultar em infrações à LGPD, com penalidades que podem chegar a R$ 50 milhões. Percebe-se, assim, a incongruência entre a regulamentação que obriga o cumprimento da LGPD e, simultaneamente, a divulgação de dados salariais detalhados, já que o atendimento de uma delas poderá expor as empresas ao risco de descumprimento da outra.

Sem dúvida, a Lei da Igualdade Salarial propõe avanços significativos na equidade de remuneração de gênero, mas a implementação da obrigação de transparência salarial traz consigo desafios e riscos substanciais não somente para as empresas, como também aos próprios trabalhadores, que podem ter seus dados pessoais inadvertidamente divulgados se estes não forem adequadamente anonimizados.

Em um cenário de crescente preocupação com a privacidade dos dados pessoais, a interseção entre transparência salarial, LGPD e a possibilidade de judicialização exige uma abordagem jurídica estratégica. É importante obter orientação jurídica especializada para navegar por essas águas e garantir que as empresas cumpram suas obrigações sem comprometer a conformidade legal e a segurança dos dados de seus trabalhadores.

Por Fabiana Nitta, sócia de SMDA – Sonia Marques Döbler Advogados